Monday, November 20, 2006

Artigo - Chuvas, Desperdício e Saneamento

Liliana Peixinho *
liliana@amigodomeioambiente.com.br
lilianapeixinho@yahoo.com.br


Chuvas, desperdício e saneamento


As últimas chuvas que caíram na Bahia, inundando ruas, derrubando casas, aumentado os buracos das pistas, matando pessoas e proliferando doenças, revelam também o grau de descaso com o saneamento básico, a qualidade da água, com a Vida. Das enxurradas descem toneladas de resíduos sólidos, dos mais variados, como plásticos, papel higiênico, restos de comida, papelão, vidros, entre outros resíduos que chamam de , “lixo”, mas, que bem poderiam não estar alí, ampliando o leque de problemas à saúde e deslocamento da população; mas, em outros lugares, agregando valor à geração de renda, às campanhas contra o desperdício, ao espírito lúdico de crianças, que transforma “lixo” em arte. È muito o volume de coisas que jogamos fora, em qualquer lugar, sem nenhum critério de reutilização, racionalidade no uso, reciclagem e que, com as chuvas, acabam boiando aos nossos olhos, incrédulos.
A falta de manutenção dos esgotos, das galerias da rede subterrânea de água, associada ao desmatamento das encostas e à falta de coleta seletiva do lixo, até mesmo de unidades hospitalares, aumentam os riscos à saúde da população. Os recursos que o governo gasta com o tratamento de doenças provocadas pela falta de saneamento, pela falta de políticas ambientais preventivas, revelam uma filosofia dissonante com as necessidades atuais de preservação da vida no planeta. É inadmissível como o Governo ainda não executa ações previamente planejadas com o rigor, a urgência e a correlação entre custos e benefícios, necessários para minimizar os efeitos de fenômeno naturais e imprevisíveis como o vento e a chuva ou até alguns previsíveis, como o fogo nas florestas.
Em visita recente à Bahia a ministra do Meio Ambiente Marina Silva disse que a existência de lixões é um dos mais graves problemas ambientais do Brasil e que está trabalhando por uma política nacional de resíduos sólidos. Enquanto o projeto é idéia, o fato é que milhões de pessoas, na sua maioria crianças e idosos, estão morrendo. De acordo com artigo publicado no site Terra das Américas e distribuindo pela Agência Envolverde na REBIA- Rede Brasileira de Informação Ambiental, de autoria de Diego Cevallos “A diarréia, por falta de água segura, limpa, mata mais crianças na América Latina do que a tuberculose ou o HIV/aids, alerta a ONU. Milhões de meninos e meninas, sobretudo indígenas e afrodescendentes, estão em perigo”. E a diarréia é somente uma das doenças da extensa lista resultante da falta de qualidade na água.
Essa política não integrada, de visão estreita sobre a sustentabilidade como fator resultante de comportamentos preventivos, cuidadosos, harmoniosos, racionais, menos consumistas, está levando cientistas sociais para uma posição pessimista com relação a um futuro próximo. Se as crianças, que representam a esperança de construção desse paradigma sustentável, estão morrendo de doenças preveníveis, como diarréia e doenças respiratórias, o futuro não pode ser animador. “Para as crianças que não têm água limpa e saneamento, o futuro é de morte, pobreza e doenças, e isso provavelmente os seguirá pelo resto de suas vidas”, disse ao site Terramérica Liliana Carvajal, uma das redatoras do Informe sobre Desenvolvimento Humano 2006, apresentado, no dia 9 de novembro, pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud).
O documento diz que “a água limpa e o saneamento estão entre as medidas preventivas mais poderosas para reduzir a mortalidade infantil. Representam para a diarréia o mesmo que a imunização representa para as doenças mortais”. O Brasil, a Bahia têm grande potencial de água sem a devida contrapartida de preservação dos seus mananciais. A AMA –Amigos do Meio Ambiente, movimento que luta em favor da preservação da vida, mostra, em sua exposição permanente e itinerante “O Homem e o Meio Ambiente”, que a água e as diversas formas de seu uso, cuidado, captação, estocagem, distribuição, parece ainda não representar grandes riscos para a preservação da vida.
O Informe Sobre Desenvolvimento Humano, que o Pnud divulga anualmente desde 1990, enfatiza que investir em água e saneamento salvaria milhões de vidas, com agregação de valor econômico. O acesso universal a serviços de água e saneamento reduziria a carga financeira dos sistemas de saúde nos países em desenvolvimento em cerca de US$ 1,6 bilhão ao ano. Em países como a Noruega, a água limpa reduziria em mais de 20% os casos de diarréia; no Peru 15% e na Guatemala cerca de 40%, segundo o Pnud.
No Brasil o déficit de saneamento representa mais de 40 bilhões de reais. E o que se gasta para socorrer, fazer de conta que resolve, não só tem matado como alimentado o vício de políticos compradores de votos de pessoas que são levadas a trocar o seu direito de escolher pelo “dever” de pagar caro por um pote de água de qualidade duvidosa.

Liliana Peixinho * - Jornalista, Correspondente na Bahia do Jornal Folha do Meio Ambiente, Moderadora da REBIA – Nordeste Rede Brasileira de Informação Ambiental, Coordenadora da AMA – Amigos do Meio Ambiente.