BRASIL DESPERDIÇADO
Por: Liliana Peixinho *
Jornalismo é caminho de investigação para ver como a vida se faz: em paz, ou em guerra. Para escrever, narrar, contar histórias, há que se vivê-las, no todo ou em pedaços, reconstituídos em elos, de tempo, espaço, fatos. Sempre digo a mim mesma que escrever é ato de vomitar palavras - sobre uma realidade distoante do que estamos a tentar garantir como direito -; ou, quem dera e raro, um desenhar de letrinhas em construção de verbos como amar: o todo, longe ou perto, para fazer da vida: beleza, harmonia, prazer e alegria.
Tarefa nada fácil de se realizar em ambientes onde a pressa capital não abre espaço para o fazer profundo, sentido, vivido em cérebro, alma e coração plugados numa visão de mundo onde a maior parte da população do planeta está fora da zona de conforto. Senão, vejamos: como não sentir dor, se envolver, numa matéria por exemplo, sobre os atendimentos de emergência nos grandes hospitais públicos brasileiros? Como não mostrar indignação com a tal crise de abastecimento d'agua no país topo da biodiversidade planetária, cuja condição privlilegiada poderia garantir a naturalidade dos ciclos d'água, em seus tempos climáticos, caso não houvesse interferências criminosas como desmatamentos, da Amazônia à mata atlântica do sul da Bahia, associados a outros atos criminosos como o desperdício, a falta de cuidado, das nascentes às torneiras!
E ainda tem a cara de pau das autoridades quando evocam Deus para socorrer o caos feito por eles mesmos, em desmandos de gestões fraudulentas. Precisamos associar que a falta de qualidade da água, que temos em abundância, está ligada ao comportamento do mau uso cotidiano, aqui, ali, acolá. Dados do Fórum Mundial da Água revelam que: o abastecimento público consome 10% da água; o desperdício na rede física, varia entre 25% a 40%, sendo de 70% , o índice de poluição dos rios. O tratamento da água é caro e ineficiente e com dados absurdos de que 100 milhões de brasileiros estão sem saneamento básico, sem acesso a esgoto tratado. Imagina a cadeia de doenças que poderia ser evitada, se fôssemos preventivos, educados, civilizados.!! Precisamos de uma massiva, permanente e eficiente campanha de educação doméstica, como aliada do cuidado com àgua, a partir de cada morador, em suas residências, empresas e instituições.
Tristeza maior que tudo isso ai junto, é ver adolescentes e jovens fazendo de conta que estudam, que lêem, que aprendem, numa cadeia sem nenhuma sustentação de estruturas produtivas harmoniosas. Os ambientes são de muito descaso com a vida, de desleixo com as coisas conseguidas a sangue e suor, sem o ouvir d'alma das histórias de quem tem experiência com erros, para fazer deles, um aprendizado, um salto, um pulo para um novo fazer, um novo jeito de viver, com menos dor, mais harmonia, e quem saber até alegria, de verdade, além dos selfies rasos, ostentando mentiras e faz de conta.
Nesse domingo cedinho estava a ver o Globo Rural, programa que mantém uma qualidade de conteúdo preciosa, para quem se importa com a vida em ambientes de cuidados, a partir da riqueza natural, e fiquei encantada com a forma como os peruanos cultivam a batata como identidade nacional, e mantém um banco de sementes com mais de 4 mil espécies do tubérculo, com estruturas bem simples, sem uso de tecnologias avançadas, quase artesanal, mas em muito cuidado e fazer responsável. Em seguida, o bom jornalismo do repórter em campo, mostrou que em Minas Gerais, por exemplo, antigos plantadores de batata, faliram, por não conseguir pagar seus débitos com bancos financiadores de capital, para compras de equipamentos que estão jogados, enferrujados, virando sucatas, em galpões gigantes, e que devem ir a leilão sabe-se lá quando. Quando a Justiça finalmente, resolver agir, com certeza será tarde, quando nada mais servirá para uso e terá que se começar do zero, tudo de novo, em ciclos perversos de vidas.
O caso de Minas é apenas um, mostrado hoje, e que se multiplica por ai em todos os lugares desse pais. Me diga ai alguém que nunca viu, Brasil afora, equipamentos diversos, de prédios a tratores, carros, máquinas, computadores, alimentos, se estragando, sem uso, por conta de lentidão burocrática! Esse desperdício, em larga escala, mostra o Brasil que estamos a viver. Um país entregue ao descaso, ao descuido, ao desperdício, ao desamor ao outro, ao futuro. Tristeza maior não há!
Em 2001 fizemos, à mão, com lápis de cor, essa logomarca ai na foto, do Movimento AMA - Amigos do Meio Ambiente. Um abraço ao Brasil, que chora - veja a gotinha pingando - pelo descuido com os seu maior patrimônio, aquele que garante a vida em ambientes com ciclos de renovação.
Liliana Peixinho* - Jornalista, ativista, fundadora dos Movimentos AMA - Amigos do Meio Ambiente, REAJA - Rede Ativista de Jornalismo Ambiental, RAMA - Rede de Articulação e Mobilização Ambiental, Mídia Orgânica E CATADORA DE SONHOS.
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