Thursday, February 27, 2014

MIDIAS e CIDADANIA AMBIENTAL


Mídias e Cidadania Ambiental

Ter, 11/Mai/2010 00:00 Artigos científicos
Por Liliana Peixinho *

O papel da mídia na construção da cidadania ambiental é pauta corrente, urgente e desafiadora no processo de mudança de comportamento diante do que o planeta está a nos exigir para garantir a vida, com harmonia e decência. Apesar de ser consenso entre jornalistas, ambientalistas, ativistas e até empresários conservadores, o desafio é sensibilizar editores, diretores, proprietários de grandes veículos, empresariado e público consumidor de notícia, sobre a necessidade de informações didáticas na agregação de valor construtivo para uma interação harmoniosa entre produtor, consumidor e a matriz: recursos naturais.

Jornalistas especializados na área de jornalismo ambiental como Silvestre Gorgulho, diretor da Folha do Meio Ambiente; Washington Novaes, escritor e jornalista dedicado à área; Sinval Leão, diretor da Revista Imprensa; Nely Zulmira, criadora do Repórter ECO; André Trigueiro, do Programa Cidades e Soluções, Globo News; Vilmar Berna, da Rebia e Portal do Meio Ambiente; Dal Marcondes, da Agencia Envolverde; professora doutora Simone Bortoliere, Facom- Bahia e vice-presidente da ABJC- Associação Brasileira de Jornalismo Científico, dentre muitos e muitos outros Brasil afora, vem se especializando continuamente para ocupar demandas reprimidas.

A pauta interna das redações sobre o seu papel na construção da Cidadania Ambiental precisa de aprofundamento, cuidado com os detalhes, para a produção da informação com qualidade. Questão que requer compromisso do jornalista/repórter na disposição pessoal de investigar e confrontar fontes diversas para retratar fatos. Compromisso que deve ser extensivo aos proprietários dos veículos em sua representação histórica do poder de decisão no quê, como, quando, quanto e onde, será dada, ou não, uma informação.

A sobrevivência da mídia alternativa ambiental é pauta constante de discussão entre especialistas e o problema é sério para garantir, ou não, a publicação da próxima edição da revista, do jornal, da manutenção do site ou blogs que precisam de captação/banners, parceiros como contrapartidas financeiras para estar ou não no ar. Se as novas ferramentas midiáticas abrem possibilidades para o jornalismo cidadão, para a democratização da informação, para a inclusão digital, também coloca em cheque a qualidade e credibilidade da noticia.

Para continuar desenvolvendo trabalhos independentes, investigativos e comprometidos com a construção de uma nova forma de ver e sentir os alertas dados pelo planeta, precisamos mesmo continuar na sala de aula reaprendendo como informar bem para garantir o uso da informação em favor da vida, com qualidade. Perdemos colegas de trabalho cada dia mais cedo por problemas de saúde que poderiam ser evitados como
estresse, estafa, câncer de estomago, pulmão, acidentes. No entanto, como profissionais especialistas em absorver problemas, ainda não conseguimos garantia de recursos para construir a vida, com qualidade. As empresas de comunicação, os grandes produtores de poluição, a sociedade em geral, e cada pessoa, individualmente, são chamados a mudar de comportamento. Essa mudança não tem se mostrado fácil. Historicamente não fomos educados para preservar, mas para consumir demasiadamente num modelo econômico, perverso, e agora em cheque. Ainda não temos a cultura de utilização racional dos recursos naturais rumo à construção do novo paradigma da sustentabilidade cidadã.

A Sociedade é alimentada, diariamente, por uma política perversa de consumo de água, energia, alimentos e diversos produtos originados/alimentados por cadeias produtivas insustentáveis, de ponta a ponta, desde a exploração da mão de obra do trabalhador, passando pela falta de qualidade do produto, a balanços patrimoniais com lucros exorbitantes para o produtor, sem contrapartidas de reposição da capacidade do planeta, cada dia mais limitada, em repor esses recursos. O desafio de promover o desenvolvimento, a melhoria da qualidade de vida, de forma racional, cuidadosa, planejada, disciplinada, com prazer, alegria e consciência, ainda não é uma prática comum dos humanos. Aliás, consciência é atitude rara no senso comum dos “racionais”. E quem tem e pratica com razão (cérebro), emoção (coração) e espírito (alma) é alvo de criticas debochadas e irritantes. Infelizmente a realidade aponta um caminho longo e com desafios cotidianos crescentes para a adoção de ações verdadeiramente sustentáveis.

O pensar e fazer transversal, proposto pela ex-ministra do Meio Ambiente, senadora Marina Silva, candidata a presidente do Brasil, poderia ser lida com outro foco, como ação de valor multiplicador, em todas as esferas de decisão política, seja nas instituições do governo, Ongs e/ou paralelamente, em cada pessoa, na construção civilizada de uma cidadania ambiental.

* Jornalista, ativista sócioambiental, especializada em Mídia e RSE - Responsabilidade Social Empresarial, fundadora dos Movimentos AMA e RAMA – Rede de Articulação e Mobilização em Comunicação Ambiental (www.amigodomeioambiente.com.br)

MARKETING VERDE X REALIDADE INSUSTENTÁVEL


Virou Notícia

Marketing verde x realidade insustentável

greenwashing_250Por Liliana Peixinho*

De que maneira a Comunicação pode contribuir, ou não, com a sustentabilidade? A informação veiculada e acessada, filtrada, pode ajudar na mudança de comportamento? Como isso pode acontecer, de fato? Se formos verificar o volume de investimentos que governo e empresas realizam, para propagar programas e produtos, podemos supor que as contrapartidas em visibilidade, credibilidade e por conseqüência, consumo, apresentam retornos que satisfazem bem os interesses de uma das partes da cadeia, os investidores. Mas, e o consumidor, esta satisfeito? E a matriz de produção, tem sido preservada, cuidada?

É objetivo deste artigo despertar a atenção sobre forma, velocidade, conteúdos e resultados de comportamentos construídos pela mídia, através da propagação massiva de conteúdos, sob o olhar da sustentabilidade. Essa pesquisa é reforçada por depoimentos de especialistas e jornalistas sobre o cotidiano brasileiro, mostrando quão distante anda o discurso, generalizado, da prática. Onde a garantia da Vida se revela frágil quando observamos o caos em setores importantes como saúde, educação, transportes, moradia, emprego. Problemas sentidos de perto por quem mais o governo diz estar dando atenção: as classes média e pobre.

Entre especialistas em comunicação circula informações sobre a velocidade da propagação do conceito sustentabilidade e a necessidade de entender melhor o sentido profundo da expressão, usada massivamente sem a devida interseção harmônica nas escalas de produção. Mais do que significado, uma frase vale por seu efeito estético, moderno, linkado com uma realidade que insiste resistir aos desafios de mudanças de comportamento para a sustentação de sistemas fragilizados pela ganância, lucro fácil e rápido, desperdício de tempo e recursos, em nome de uma Vida frágil e ignorada.

Apesar do apelo ideológico difundido massivamente, com reforço diário do discurso da sustentabilidade, o conceito parece estar distante de práticas, ações, gestões, comportamentos, que levem equilibrio, harmonia, entre o que, como, e quanto se produz, na cadeia das atividades econômicas. Nesse contexto, como a Comunicação, o jornalismo, a publicidade, as redes sociais, as listas de discussões, os grupos virtuais, blogs, sites, entre outros, podem contribuir com informações, transversalizadas, contextualizadas historicosocialmente, para a construção de uma nova mentalidade, um novo jeito de pensar, fazer, se comportar, agir, mudar, no que tem se mostrado, demandado, como necessário e urgente?

De um lado vemos que os avanços da Ciência no prolongamento da Vida humana estão desconectados com a mesma fragilidade que essa vida se mostra em ambientes criminosamente impactados por essa mesma ação humana. Esse paradoxo entre as descobertas científicas e a preservação da Vida, num planeta que ainda estamos a conhecer, parece desconsiderar o tempo como o grande protagonista da História, que é determinada por ele. O homem pode viver 100, 110 ou mais, ao mesmo tempo e no mesmo lugar, crianças que nascem, agora, não garantem o início da vida por falta de direitos simples, como poder dar o primeiro suspiro numa maternidade com as mínimas condições profiláticas para isso.

Estamos bombardeados de propagandas sobre produtos que causam obesidade, problemas cardíacos, diabetes, câncer e um sem número de doenças, diretas ou indiretamente relacionadas ao que consumimos. E não temos proteção para atendimentos médico, psicológico ou jurídico, necessários, decorrentes de comportamento construídos por uma mídia que parece focar apenas na sedução para a compra, desconectada com os resultados gerados pelo comportamento que a mensagem produziu no espectador, leitor, internauta, ouvinte, dentro ou fora de casa.

A televisão, por exemplo, entrou no mercado, nas lares, com força e poder para ditar comportamentos desproporcionais ao poder aquisitivo dessas famílias que se sentam, absortas, em frente a telinha. Vemos agora esse poder sendo dividido, compartilhado, distribuído para as redes sociais, onde esse mesmo poder da mídia veio ainda com mais força, com velocidade ainda maior, para transpor o tempo, agora imediato, real. A mesma competência que esteia o discurso da mídia verde vazia deve ser buscada com a inteligência exigida pela urgência que estar a querer a Vida, harmoniosa e sem pressa, como dever e merecemos ser.

Essa mídia apressada em estimular o consumo pelo consumo vem empurrando a Vida para uma correria para comprar carro para ficar preso em engarrafamentos, nas rodovias e centros urbanos. Acordar cedo para trabalhar fora de casa para pagar uma babá que também deixou o filho em casa para ir trabalhar, alimentando cadeias de vida insustentáveis. Se formos analisar o ciclo perverso sobre o trabalho das mães babás dos filhos dos outros, por exemplo, o custo social desse comportamento pode ser exemplo de diversos outros ciclos de via crucis da vida.

E dever da Comunicação estar atenta as condições sociais para garantia da Vida? Se for e sabemos que é, então não podemos fazer de conta que não vemos empresas propagando-se sustentável, sem ser, pois ao usar trabalho escravo, impactar o ambiente e não ter compromisso em cuidar, preservar, garantir condições para futuras gerações, não é sustentável. E, como disse o colega Andre Trigueiro, nós jornalistas, temos obrigação em dizer e mostrar porque projetos ditos sustentáveis, não o são, de fato. Claro que isso dá trabalho, precisa de investigação, coragem, e uma dose de ética que o mercado publicitário, e mesmo jornalístico, não parece estar interessado, em sua maior parte. Ter jornalistas que façam essa diferença nas redações e agora, nos blogs e mídias sociais, parece ser o caminho para aqueles que querem e acreditam no fazer como compromisso de mudanças.

Apesar da visibilidade midiática e da evolução do conceito: desenvolvimento sustentável, a realidade cotidiana demonstra, nos faz ver, perceber, sentir, registrar, que ações, de fato, sustentáveis, são difíceis de comprovar diante de realidades diárias sobre a natureza humana e ambiental. Essas faces do ambiente estão degradadas, violentadas, exploradas, impactadas. A sustentabilidade tem sido ênfase dos discursos, peças publicitárias, propagandas, falas de governo, empresas e ONGs. De forma competente e criativa percebemos o apoderamento do termo para surfar na onda do marketing verde vazio.

Quando alguém, um governante, um empresário, um representante de um instituto, ONGs, associação, diz que faz um programa dessa ou daquela maneira e não o faz, de fato, como anuncia, qual deve ser o comportamento da mídia?. O corporativismo, com certeza, é outro elemento dificultador. O medo de perder emprego, contrariar interesses, mais forte ainda. O compromisso com os efeitos da informação não parece ser prioridade na agenda, nem mesmo nos compromisso da academia.

A Carta da Terra diz que “devemos somar forças para gerar uma sociedade sustentável global baseada no respeito pela natureza, nos direitos humanos universais, na justiça econômica e numa cultura de paz. E, que para chegar a esse propósito, é imperativo que nós, os povos da Terra, declaremos nossa responsabilidade uns para com os outros, com a grande comunidade da vida, e com as futuras gerações”. Nesse contexto, é imperativo reforçarmos o saber como instrumento de construção, impulsão, para qualquer modelo, jeito de viver, que reforce a condição humana como frágil, limitada, diante do poder da Natureza, cujas facetas, climáticas, por exemplo, a própria Ciência ainda ignora, desconhece?

E, como a vida continua pautada no consumo, seja de idéias, fazeres e experiências, necessário e 
sensato, parece ser, adotar políticas, práticas, comportamentos, que alimentem a construção de cadeias de suprimentos onde, fornecedores, distribuidores, varejistas e consumidor final, estejam em harmonia, em sintonia, com as adaptações que o planeta, o ambiente, rural ou urbano, estar a nos exigir, para a garantia da Vida, em suas diversas formas.

* Liliana Peixinho é jornalista, ativista, fundadora dos Movimentos AMA (Amigos do Meio Ambiente) e RAMA (Rede de Articulação e Mobilização Ambiental). Especialização em Mídia e RSA. MBA em Turismo e Hotelaria. Especialização em Jornalismo Científico e Tecnológico – UFBAlilianapeixinho@gmail.com /

Wednesday, February 19, 2014

10/03/2011 13:14:56

Protagonismo feminino e retrocessos sociais

Liliana Peixinho*
A força interna da mulher canaliza energias que passam pelo cérebro, na razão do cuidado; vai para os músculos, na emergência em fazer tarefas, enfrentar desafios, e persiste, insiste, diante do incansável, perene e obstinado desejo de cuidar, proteger, superar-se, a cada nosso desafio. Performances que às vezes, no drible ao tempo, deixam marcas, cicatrizes expostas, dores, sofrimento, perdas irrecuperáveis. Entre a satisfação dessas superações e a dor do não compartilhamento de tarefas amenas, como o amor e cuidado com a educação, orientação dos pais, aos filhos no lar ou fora dele, fica a incerteza do futuro que estamos a desenhar para as novas gerações. Estamos, a cada novo dia, aumentando o percentual de mulheres que, sozinhas, são responsáveis pelo provimento das despesas da casa. No Norte e Nordeste do Brasil isso é mais agravante porque o número de filhos é maior e as oportunidades de trabalho bem menores que em outras regiões.
A luta da mulher pela conquista de espaço, reconhecimento, direitos e inserção social acompanha o próprio desenvolvimento humano. Muito se conquistou, com certeza, com sangue, suor e lágrimas. O papel multifacetado da mulher é reconhecido pela mídia, movimentos sociais, coletivos profissionais, pela própria instituição familiar que estão a destacar a luta da mulher como pessoa, ser humano, mãe, trabalhadora, tia, avó, amante, esposa, amiga, confidente, e os mais diversos e infinitos papéis que ela sempre esteve, está e estará fadada a desempenhar na construção de novas civilizações. Socializar essa discussão com ações cotidianas, focar desafios e mudanças para uma Economia circular, cidadã, sustentável é uma nova pauta na velha luta pela preservação da Vida.
Se as conquistas femininas por um lado nos enobrece, aumenta a nossa auto-estima, nos honra e nos orgulha, paradoxalmente esta a nos entristecer, fazer pensar, repensar, ponderar, porque essas conquistas deveriam nos fazer mais felizes, menos estressadas, mais harmoniosas e menos exploradas. E isso não está acontecendo proporcionalmente às nossas conquistas históricas. Ainda somos minoria no parlamento, ainda ganhamos muito menos que os homens, fazendo as mesmas funções, temos jornadas múltiplas, com acúmulo de tarefas, ainda não nos reconhecemos para nos elegermos para defender o nosso próprio protagonismo na luta por direitos. E isso é um contrasenso indignante.
É inegável o reconhecimento da participação feminina nos mais diversos ambientes de produção. A mulher se destaca como produtora do conhecimento, difusora de informações, gestora de conflitos, executora de ações verdadeiramente sustentáveis dentro das Cadeias Produtivas, de ponta a ponta, seja no lar, no trabalho, na escola, na família, na comunidade, na política, na economia. Enfim, o olhar, o fazer, o cuidado feminino, é instrumento revolucionário para a construção do novo paradigma do equilíbrio entre as necessidades de consumo e a preservação de matrizes energéticas limpas.
Guerreiras do Brasil e mundo afora que estão na luta pela conquista de novos degraus, no mais alto grau da representação política de um país, Marina, Dilma, Ana, Tereza, são oportunidades que nós, mulheres e/ou homens com sensibilidade feminina, temos agora, para reconhecermos, de fato, esse protagonismo feminino histórico. É importante nos apoderarmos de informações claras e diversas para analisarmos causas do desperdício de direitos, valores e projetos da sociedade, saber contextualizar a crise estrutural do capitalismo, desenhar e perseguir uma nova visão integrada, holístíca, multifacetada, atenta a necessidades de cumprimento de todas as etapas para a formação de cadeias produtivas alinhadas às novas mudanças de um planeta sedento de cuidados para garantirmos a Vida.
Planejamento, atitude, luta, aplicação de políticas para o desenvolvimento humano sustentável, com eqüidade, justiça social e equilíbrio ambiental, são fases importantes para qualquer ação no presente e garantia do futuro. Precisamos colocar em prática atitudes de mudança no consumo em nome da preservação da vida. Visito faculdades, empresas e instituições que têm projetos ditos “sustentáveis”, mas que não passam das idéias. O desafio é a garantia da vida com qualidade, prazer, alegria, desejo de querer fazer não porque alguém nos manda, ordena, impõe, mas porque sabemos ser necessário, importante no papel de cada um, em casa, no trabalho, na escola, no lazer.
Oportunidades que estão diretamente linkadas com a necessidade de mudança de comportamento para uma agenda doméstica sustentável, com novas atitudes sobre Consumo Consciente, Comércio Justo, Produto Limpo, Desperdício Zero, Cultura dos RRRRRR – Repensar, Racionalizar, Reduzir, Reaproveitar, Recriar, Reinventar, Reciclar, Revolucionar, através da participação social proativa, voltada para uma Economia Circular, sem desperdícios, com aproveitamento integral, total, de tudo, com resíduos na perspectiva do zero.
Mais do que entender os efeitos negativos provocados pelo Aquecimento Global e as grandes catástrofes verificadas nos últimos anos, está faltando ao Ser Humano entender, interiorizar, absorver, no coração, alma e cérebro, que a felicidade em Ser pode estar na busca do encontro com o outro. E para caminhar nessa direção precisamos enfrentar, ainda mais, novos obstáculos, abrir mão de comportamentos egoístas, imediatistas, superficiais e meramente repetitivos, convencionais, para transgredir, subverter e quebrar regras milenares em nome da dinâmica natural das leis do Universo, com renovação, invenção, criatividade, compromisso e prazer em fazer.
*Liliana Peixinho é jornalista, ativista socioambiental. Fundadora dos Movimentos Livres AMA/ RAMA – Amigos do Meio Ambiente e Rede de Articulação e Mobilização Ambiental Pós graduada em Mídia e Meio Ambiente.http://www.amigodomeioambiente.com.br/ lilianapeixinho@gmail.com 71 – 9938–0159 .
(Envolverde/O autor)

08/03/2013 19:19:56

As guerreiras do sertão

Liliana Peixinho, especial para o Mercado Ético
Fotos: Liliana Peixinho
Hoje (8), em um programa de TV, escritora Fernanda Young disse que “a mulher não dorme, ela dá um tempo”. E ousou acrescentando ainda que “a mulher moderna é aquela se permite ser um pouco relapsa”.
Depois de 63 dias dirigindo sertão adentro, vi de perto mulheres que não se dão o direito de serem relapsas. Como se dar a esse luxo sem que, para isso, tenham que fazer de conta que não vêem, sentem nem ouvem as necessidades de seus filhos? Como ser relapsa vendo o companheiro desempregado, o rio seco, a plantação morta e os bichos caindo de fome? Geralmente dependem delas uma família inteira, numerosa. Precisam dar de comer e vestir, cuidar da saúde dos seus em ambientes de muita carência.
Vi mulheres em filas – avós, mães, filhas, netas, sobrinhas -, com latas na cabeça, andando léguas, debaixo de um sol escaldante, à procura de água. Ou com bacias cheias de roupas, procurando um poço para lavá-las. Vi mulheres andando nas estradas, quilômetros e quilômetros, para comprar e carregar suas feiras com feijão, farinha, arroz, e comida que se plantava na roça, mas que agora, por causa da seca, não produz mais.
Mesmo diante de cenários desafiadores, as mulheres resistem ao flagelo da seca. Elas criam, transformam, improvisam, inventam, tentam, conseguem e enfrentam as dores perdas e dificuldades. A capacidade de trabalho da nordestina chega a indignar de tanta abnegação. Depois de tanto correr, lutar, desafiar, entregar-se inteira na criação de filhos, sobrinhos, netos e vizinhos, a guerreira ainda não se permite dizer não.
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(Mercado Ético)
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COMENTÁRIOS

José Carlos Costa10/03/2013 às 19:23
Esta matéria tem que ser levada para a televisão para forçar a presidente e os políticos a tomarem vergonha na cara e agirem em prol desse povo!!!
Até quando vamos permitir??
Christina Carvalho Pinto13/10/2013 às 13:57
Liliana, o coração da gente seca e dói ao ler sua impressionante série de reportagens sobre a situação do nordestino e o cinismo dos governantes. Para mim, um dos perigos mais importantes que você traz à luz e desmascara é essa linguagem estética e beirando a literatura que costuma prevalecer nas reportagens sobre o Nordeste, anestesiando o olhar das audiências. Você nos coloca dentro da cena verdadeira, com grande humanidade. Todos os parabéns! Com admiração ao seu trabalho e vergonha de ser brasileira nesta pseudodemocracia,
Christina.
Liliana Peixinho14/10/2013 às 17:36
Cara Christina Carvalho Pinto
Tremendo aqui, de emoção, com seu comentário. Obrigada mesmo Christina, importante saber que a vozes tem escuta. E o que tentamos fazer é isso. Valeu cada quilômetro rodado, cada pessoa que cruzei nos caminhos e mais ainda, poder voltar e dar retornos. Na fé e coragem, sempre. Valeu!
Liliana Peixinho14/10/2013 às 17:39
Valeu José Carlos Costa
Pois é, a demanda é histórica e reprimida. Os desafios continuam na pauta. Que bom que temos parceiros como vc.
Sds harmoniosas
Liliana Peixinho
07/03/2013 17:32:24

Imagens da seca

Liliana Peixinho, especial para o Mercado Ético
Durante 63 dias, a jornalista e ativista ambiental Liliana Peixinho percorreu os caminhos da seca no Nordeste. Passando por estados como Pernambuco, Bahia, Sergipe e Alagoas, seu desafio foi viver de perto o desafio das pessoas que ali buscam sobreviver. Cozinhou, lavou, andou quilômetros à procura de água, deu aula, distribuiu livros e até mesmo criou alguns laços afetivos.
Confira abaixo algumas imagens dessa jornada.

O pôr do sol do sertão esconde, em sua beleza, a dor do povo resistente. / Fotos: Liliana Peixinho

Dona Silvia, na roça Alto do Céu, com o peso do balde d'água na cabeça. Todas as noites ela ora a Deus pedindo para que a chuva caia

Paisagem desértica do sertão nordestino. Pastos secos, áreas desmatadas sem vida e sem chuva.

O menino da porteira mostra como a força e a coragem do nordestino são cultivados desde cedo

A vaca enfraquecida por falta de pasto e ração é exemplo do que vem ocorrendo com toda a pecuária da região.

Em Bebedouro, o menino Dudú observa o tanque d'água baixar dia após dia

Nas estradas do Nordeste adentro, o que mais se vê são carros-pipas. Ao mesmo tempo em que levam alívio ao povo sofrido, alimentam a cruel indústria da seca


A india Kiriri "Mãe Eduarda" é uma guerreira na labuta pela garantia da vida

O leito do rio completamente seco espera pelas chuvas desde o final de 2011.


Fornos de carvão ajudam no desmatamento da caatinga já castigada pelo aumento dos pastos
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06/03/2013 18:41:54

Umbuzeiro: símbolo de vida e resistência

Liliana Peixinho, especial para o Mercado Ético
“Não existe seca para matar um pé de umbu!” A frase dita por Sebastião de Oliveira Matos, pequeno agricultor de Monte Santo (BA), revela como há muito mais relação entre essa planta e o povo nordestino do que se possa imaginar. Mesmo diante de uma seca violenta, com tudo torrado, o chão rachado, observa-se uma árvore aqui e acolá, verdinha, sozinha, mostrando que não será fácil lhe secar a vida. Por essas e por outras, o umbu é o fruto mais popular e generoso do sertão.
“Os umbuzeiros sempre resistem. Mesmo na seca eles dão frutos. Esse ano foi pouco, mas deu”, conta Matos.

Luquinhas, um pequeno e valente nordestino, brinca nos galhos do umbuzeiro, outro nordestino tão bravo quanto ele. / Fotos: Liliana Peixinho
Renda complementar
Segundo informações da Empresa Baiana de Desenvolvimento Agrícola (EBDA), agricultoras e familiares do povoado de Caldeirão, localizado a seis quilômetros do município de Uibaí, são orientados a aproveitarem a safra do umbu na merenda escolar da região. Ação que integra o Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae) e o de Aquisição de Alimentos (PAA).
O período mais abundante do umbu é de dezembro a fevereiro. Nessa época pode-se ver a fruta cair, aos montes, em quintais, praças e plantações. Os agricultores são chamados a participar de capacitações promovidas pela EBDA que mostram os benefícios que o umbu pode oferecer, como por exemplo a complementação de renda.

Dizem que nem a pior das secas é capaz de acabar com os umbuzeiros
Segundo a empresa, cerca de 20 mulheres da Cooperativa Mista Agropecuária de Uibaí estão transformando a vida de suas famílias com o umbu. “Vemos a mudança acontecer na vida de cada uma delas. Hoje elas têm geladeiras e eletrodomésticos, que são a realização de um sonho. Tudo por conta desse trabalho em grupo,” conta Elisete Rocha, técnica da EBDA.
Durante o período da safra, as agricultoras fazem as polpas durante as manhãs, e, às tardes, realizam a colheita dos frutos. “Com essa dinâmica é possível produzir em média 200 quilos de polpa de umbu, que são entregues às escolas do município. O excedente vira geléia, sorvete e compota”, explica Elisete.
De acordo com Arnou Dourado, outro técnico da EBDA, com o curso de beneficiamento do umbu, as agricultoras também aprenderam a desenvolver receitas com ingredientes simples e de pouco custo. “O intuito é agregar valor ao umbu. A cocada rústica, por exemplo, leva somente açúcar, a pasta do fruto e o coco ralado, o que valoriza o doce”, afirmou o técnico.
Veja abaixo algumas receitas que podem ser feitas com esse fruto valente.
Umbuzada

O umbu serve como alimento e gera renda extra para o nordestino
Iguaria tradicional nordestina, a umbuzada é feita com o fruto do umbu, verde, inchado ou maduro, cozido, batido no liquidificador, tirado os caroços e, depois, misturado ao leite e ao açúcar. É nutritivo e saboroso.
Vinho
Jaime dos Anjos, 50, dá a receita do vinho que sua mãe, Bebé, preparava com o umbu. Deixa-se o fruto de molho no álcool. Espera fermentar. Depois, separa-se a polpa do caroço e côa-se para aproveitar só o suco. Com isso se faz o vinagre e o vinho, usando-o para temperar carne e degustar.
Doce
O doce do umbu é muito apreciado e fácil de preparar. Cozinha-se o umbu, de preferência inchado, nem maduro e nem verde. Separa-se, então, os caroços, misturando a polpa com açúcar para cozinhar longas horas até chegar o ponto de engrossar e colocar para esfriar e servir pastoso ou em barras cortadas. Esse produto é popular em feiras de produtos nordestinos do Brasil inteiro.
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poliana7/03/2013 às 10:00
Trabalhar a cadeia produtiva com apoio do Estado pode ser uma das saídas para maior geração de renda para muitas comunidades do semiárido.
5/03/2013 18:23:10

O Velho Chico: entre a revitalização e a transposição

Liliana Peixinho, especial para o Mercado Ético

Hoje, a trasposição do Velho Chico se resume a obras atrasadas, custos crescentes e degradação precoce de alguns trechos abandonados.
A presidente Dilma Rousseff anunciou ontem (4) investimentos da ordem de R$ 24 bilhões para levar água ao sertão nordestino. A notícia, que mais uma vez dá esperança ao sertanejo, na verdade denuncia a ineficácia de ações desconectadas para estancar o ferimento causado pela seca na região.
Símbolo maior da falta de resultados concretos das ações governamentais é o projeto de transposição do rio São Francisco, o Velho Chico. Quando anunciado em 2005, o governo disse que o povo ribeirinho seria o maior beneficiário da obra. Depois de concluído – e a previsão era que isso ocorresse em 2012 – o desvio do rio garantiria água a 12 milhões de pessoas de 390 cidades sertanejas, em estados como Bahia, Pernambuco e Sergipe. Mas hoje o que se observa é que isso está muito longe de se tornar realidade, com obras atrasadas, custos crescentes e degradação precoce de alguns trechos abandonados.
Diante desse cenário, talvez o pior elemento da transposição seja a própria transposição. Já em 2005, a viabilidade socioambiental do projeto foi rejeitada por Estudos sobre Impactos Ambientais (EIARIMA). Naquela época, houve uma grande mobilização popular contra o desvio, que contou com apoio de ambientalistas, jornalistas, ribeirinhos e parlamentares de todo o Brasil. O episódio repercutiu internacionalmente, e mesmo assim o governo desconsiderou os argumentos de inviabilidade socioambiental da obra.

Margem degradada do rio São Francisco. / Foto: Liliana Peixinho
Thiago Alves Porto, estudante de Veterinária, participou das manifestações naquele ano. Ele foi uma espécie de guardião do rio. Na época, montou plantão nas margens de um braço do Velho Chico, na Fazendo São Sebastião. Era sua missão impedir que milhares de pessoas não tomassem banho na área onde a água estava sendo captada em bombas para levar 700 metros acima e, assim, encher baldes e tonéis para matar a sede de uma multidão de manifestantes. Com relação à seca de agora, ele lamenta: “vi árvores gigantes caindo ao chão, pelo sol quente e sem água nenhuma para alimentar suas raízes. Desde que acompanho seca, nunca vi tanto sofrimento”.

Filhos da seca, crianças sertanejas que sofrem com a falta d'água. / Foto: AMA
Hoje, o rio está carente de cuidados e de preservação que lhe devolvam as condições de manutenção da vida do povo ribeirinho. Na região do Baixo São Francisco, por exemplo, o que se vê é uma paisagem estarrecedora. O leito está raso e os bancos de areia surgem como ilhas. A navegabilidade não é mais possível e os pescadores se queixam da dificuldade em encontrar peixes.
“Quando era menina, o rio era tão cheio que a gente fazia a travessia de Barreiras a Barreirinhas de barco. Cada ano que passa, o rio fica mais baixo, mais estreito, mais seco. Os afluentes vão se esvaziando”, conta Ester Carvalho de Amorim Brandão, que mora em Salvador, mas sempre passa férias em Barreiras (BA), uma das cidades do oeste do estado banhadas por diversos afluentes do Rio São Francisco, como o Rio Grande. “Estão tirando muita água do rio com os pivôs (equipamentos de irrigação), que estão detonando tudo para o cultivo da soja. Quem tem essa infraestrutura nem sente a falta d’água. Mas quem não tem nem caixa d’água está sofrendo um bocado”, conclui.
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José Carlos Costa6/03/2013 às 8:33
Ninguém está cobrando e nem responsabilizando a presidente Dilma sobre esse descalabro com os recursos públicos, sem falar na falta de fiscalização e controle dos gastos públicos.
O que se pode fazer a esse respeito? Quem, com coragem poderia fazer essa cobrança?
PAULO AMAZONAS22/03/2013 às 18:43
Novamente vem à baila a transposição do Rio São Francisco como se tratar-se de uma ‘obra de lunáticos’. A dita ‘preservação ambiental’ não foi alegada quando o governo militar resolveu construir a Usina Hidroelétrica de Itaipu, em Foz de Iguaçu,Paraná, obviamente, por se tratar de um Estado do sul do país, nada se reclamou. Agora, quando se trata de buscar uma solução para atender a milhões de cidadãos que vivem na miséria por conta da seca, vêem os mesmos de sempre ‘protestar’ por ‘impactos ambientais’, ‘desvio de recursos’, etc, quando se está a gastar bilhões e bilhões de dinheiro do povo brasileiro na construção de estádios de futebol. Isso não nos parece desperdício?
01/03/2013 17:59:25

Elos de dor e alegria nordestina

Liliana Peixinho, especial para o Mercado Ético
A indústria da seca caminha no sentido contrário ao discurso da sustentabilidade. Programas oficiais abraçam a terminologia como sendo inerente a eles. No fundo, tudo não passa de retórica vazia. O “Água para todos”, por exemplo, decepciona naquilo que o próprio nome promete. Prova disso são as torneiras secas há meses lá no sertão. Enquanto isso, o flagelo da seca se abate sobre 10 milhões de Nordestinos.

A degradação ambiental no sertão nordestino só contribui para agravar a situação da seca. / Fotos: Liliana Peixinho
“A gente tem o tíquete dado pela associação para receber àgua do carro-pipa. É uma disputa danada. Quando a àgua chega, as vezes até suja, a gente tem que dividir com todos os moradores e usá-la com muito cuidado, porque nunca se sabe quando o próximo carro vai chegar”, diz  dona Lídia Oliveira, 62, moradora da comunidade rural, Umburana, municipio de Senhor do Bonfim.
Tristeza familiar
Na roça do seu Sabino Ferreira, 79, e dona Iracema, 80, na Passagem Velha (BA), das 20 cabeças de gado que produziam 50 litros de leite por dia, seis morreram logo nos primeiros meses de 2012, quando se abateu na região a maior seca dos últimos 40 anos. Com uma aposentadoria de cerca de R$ 600, seu Sabino não consegue mais pagar o trabalhador da roça nem comprar água do carro-pipa, que custa cerca de R$ 200. A feira semanal também é prejudicada. Ela não contempla mais a necessidade alimentar da família. A isso somam-se as receitas de remédios caros para combater o colesterol alto e outras doenças cardiovasculares de dona Iracema, males esses ligados a uma dieta pobre em nutrientes, baseada em café com açúcar e farinha, cuscuz e carne de bode gorda. A mulher, apesar dos 80 anos, não é aposentada, e as dificuldades são muitas para dar conta, sozinha, de todos os afazeres domésticos: limpar, cozinhar, varrer, lavar, costurar, além de ir na cidade comprar o pão. Foi assim a vida toda de casada, onde os cinco filhos sobreviventes (tiveram sete crianças no total) foram criados com muita luta.

Crianças buscam alguma diversão em uma terra seca pela falta de chuva
Logo que levanta de noites mal dormidas, dona Iracema molha sua horta, os pés de pinha, mamão, laranja, coco e o frondoso abacateiro. Era nele que armava uma rede à sombra para descansar. Agora, ela mostra tristeza em olhar a árvore totalmente morta pela seca. Os netos e bisnetos, que sempre frequentaram os quintais da casa, não têm mais vontade de brincar no terreiro esturricado. Vidas vão se sucumbindo aqui e ali, e seu Sabino, com os olhos lacrimejados e a voz rouca, lamenta: “Se a gente morre, o gado também morre, e vai se fazer o quê?”
Solidariedade coletiva
Seu Raimundo, 76, sofre com problemas de articulação. Cheio de dores, apóia-se em um cajado para andar. Ele leva mais de meia hora para caminhar uns dois quilômetros, até a casa de amigos como dona Iracema, onde vai quase toda tarde tomar um cafezinho, fumar um cigarro de palha, jogar dominó e atualizar as novidades sobre os bichos, a família, os amigos e alimentar as esperanças de que a chuva vai chegar. Sempre leva algo para presentear a amiga, seja um fósforo, uma tapioca, uma casca de árvore para alguma dor, uma muda de planta, umas mangas, acerolas ou outras frutas que consegue, como um milagre, cultivar em sua roça. Pessoa de muito carinho e atenção para ouvir cada um que lhe chega, seu Raimundo é desses bons conselheiros e contadores de histórias.

Raimundo, Sabino e Iracema: amizade que ajuda a suportar o flagelo
O vizinho de roça de Raimundo é seu Boanerges, 72 anos. Os dois são como anjos guerreiros de fé, luta, amor e respeito. Enquanto Raimundo é obrigado a andar todo tortinho, corcunda, seu Boarnerges, também de saúde frágil, já tendo passado algumas vezes pela mesa de operação, não mede esforços para a labuta. Em sua horta, cultiva couve, espinafre, coentro, cebolinha, alface e outras folhas. Mas o dinheiro que tira com a venda desses produtos não cobre o trabalho que tem em pegar um ônibus e levar para cidade mais próxima para vendê-los na feira.
De coração mole e cultivador de boas amizades, seu Boanerges distribui muitas dessas hortaliças com seus vizinhos. No mês de janeiro, em plena seca, a horta dele acabou. As vacas, doidas de fome, pisaram em todos os pés plantados e regados à mão com muito carinho e sem nenhum agrotóxico. Mas ele não desistiu e replantou tudo, semente por semente, muda por muda. O que salva mesmo, segundo ele, é o dinheiro da aposentadoria que recebe. E, com ele, ajuda os filhos, netos e sobrinhos. Seu Boanerges é um dos primeiros moradores da Passagem Velha e conhece tudo por ali: as histórias de cada roça, quem eram seus proprietários, o tamanho da área, quem comprou de quem, quem morreu, quem casou, quem separou.

Dona Vanda serve café à repórter Liliana Peixinho
Comida regrada
Dona Vanda Maria Macedo, 48 anos, já saiu da Bahia para São Paulo, para dar suporte a gravidez da filha de 19 anos, que saiu da roça para tentar um trabalho na cidade grande. Ela ficou por lá de dezembro a março, quando teve que voltar para Euclides da Cunha para cuidar dos outros filhos que ficaram no sertão. Ela fala sobre como sobrevive para enfrentar o desemprego e regrar o benefício da Bolsa Família: “são dois quilos de feijão, um quilo de arroz, dois quilos de açúcar, um litro de óleo, dois quilos de farinha, dois pacotes de fubá. Tudo é rigorosamente dosado para durar duas semanas”.
A família é numerosa e não tem outros complementos alimentares nos quintais, como pés de frutas, legumes e hortaliças. Para isso, seria necessário água para molhar a plantação todo dia pela manhã e à tardinha.
Dona Vanda me serviu um cafezinho muito do bom e eu agradeci oferecendo um pacote de milho de pipoca, que pedi às crianças para pegarem no banco de trás do carro, estacionando num sol quente de pelar o corpo. Rudinei dos Santos, 10 anos, e seu irmão Andinho, 12, adoraram a novidade. Comendo pipocas sentados no sofá, eles contam como fazem para chegar à escola. Rudinho, o mais novo, vai de perua até a Lagoa do Saco e Andinho, o mais velho, até Currafaço, onde um ônibus da prefeitura passa, de casa em casa, pegando cada aluno até chegar na Escola Professora Alice Tereza dos Anjos, em Euclides da Cunha, há cerca de 30 quilômetros da roça onde moram. Mesmo nesse cenário de desafios, os meninos são encantadores, rápidos, sem preguiça para o fazer.

Dona Vanda e seus netos em frente à casa onde moram
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(Mercado Ético)

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COMENTÁRIOS

Sergio Ruoso2/03/2013 às 11:15
É triste mas é verdade e quem quer ajudar fica sem ter como, Faz 2 anos que desenvolvi um equipamento, que é capaz de retirar, entre 20 e 30 litros de água por 8 horas de sol e é capaz de funcionar por até 40 anos, mas não tenho apoio para produzi-lo, e o custo é 1/40 do custo de botar água com carro Pipa, e essa água vai ser limpa, pura, é só acrescentar sais minerais como nas águas adicionadas de hoje em dia.
Parece brincadeira mas é verdade.
José Carlos Costa3/03/2013 às 17:17
Gostaria de saber porque os politicos só lembram da seca em época de eleições., e depois, se afastam do assunto e de seus eleitores… e o STE fica em silêncio, aceitando as bravatas e mentiras de campanha sem exigir o cumprimento delas. Acredito que isso é motivo de perda de mandato e penalidade severa para o partido! JUSTIÇA JÁ!
liliana Peixinho4/03/2013 às 11:32
Prezado José Carlos Costa
Vejo o seu questionamento na seguinte contextualização: O Poder politico é construindo com o voto e é o povo quem o estabelece sem, muitas vezes, ter a consciência plena dessa cidadania. E, em nome de necessidades emergentes, demandadas historicamente, parece não perceber nas armadilhas que se envolve a longo prazo. Ao Poder interessa perpetuar esse jogo na medida em que não prioriza, não se compromete com a única maneira de se quebrar esse ciclo perverso, que é atavés da informação, da Educação, com os instrumentos que podem modificar esses ambientes. Enquanto estivermos satisfeitos, ou fazendo de conta que estamos satisfeitos com migalhas, será difícil o acesso ao banquete justo, sem pompas e desperdícios, mas, apenas o justo, o que nos pode orgulhar de viver dignamente. A série Especial SECA SERTAO ADENTRO, abraçada pelo Mercado Etico, através desse jornalismo que vc pode perceber, em campo, é uma contribuição no sentido de quebrar esse ciclo. Que possamos ter mais oportunidade de colaborar nessas mudanças e a sua inqueitação, com certeza, é elemento agregador nesse ambiente. Sds harmoniosas a vc e a todos os que vem comentando aqui.
Liliana Peixinho
Colaboradora
luciano cortimiglia24/03/2013 às 10:52
SERGIO RUOSO O que voce precisa para desenvolver e como é o seu equipamento ?
Eng luciano Cortimiglia Alael